A Estratégia Nacional de Inclusão Financeira 2025–2031 (ENIF) define o roteiro para expandir o acesso e o uso de serviços financeiros em Moçambique, com foco em digitalização, literacia financeira, crédito, seguros e proteção do consumidor. Tendo participado no acto do seu lançamento oficial, no dia 6 de Agosto, presidido pela Ministra das Finanças de Moçambique, consideramos que a publicação deste resumo na plataforma F4SD reforça a sua missão de informar, debater e mobilizar parcerias para o desenvolvimento sustentável. Ao disponibilizar uma síntese acessível, a F4SD facilita o diálogo entre governo, setor privado, sociedade civil e parceiros de cooperação, promovendo maior conhecimento público sobre políticas que afetam diretamente a inclusão social, económica e financeira dos cidadãos moçambicanos.
1. Introdução e Contexto
A Estratégia Nacional de Inclusão Financeira 2025–2031 (ENIF) é o documento orientador do Governo de Moçambique para consolidar e expandir o acesso e uso de produtos e serviços financeiros no país. A estratégia sucede à ENIF 2016–2022, que, apesar dos avanços alcançados, revelou limitações importantes, sobretudo em três dimensões: (i) desigualdade territorial, (ii) baixa utilização efetiva dos serviços e (iii) fraca literacia financeira.
A nova estratégia parte da constatação de que a inclusão financeira não é apenas acesso a contas bancárias, mas um instrumento de desenvolvimento socioeconómico, capaz de estimular poupança, crédito, investimento produtivo e proteção contra riscos. Para isso, Moçambique aposta numa abordagem abrangente que integra digitalização, inovação financeira, proteção do consumidor, literacia financeira e finanças verdes, alinhando-se com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a Estratégia Nacional de Desenvolvimento 2024–2043 e diretrizes regionais da SADC.
2. Situação Atual da Inclusão Financeira
2.1. Acesso a serviços
- Agências bancárias: cobertura distrital cresceu de 55% (2015) para 83% (2023).
- Agentes bancários: inexistentes em 2015, hoje cobrem 61% dos distritos.
- Agentes não bancários: atingiram 100% dos distritos até 2022, confirmando a força da moeda eletrónica.
- ATM e POS: crescimento limitado, com retração em alguns períodos devido à migração tecnológica.
Apesar destes avanços, as zonas rurais continuam desfavorecidas, com menor densidade de agências, agentes e caixas automáticas.
2.2. Contas de transação
- Contas bancárias: passaram de 25,1% (2015) para 30,6% (2022) da população adulta.
- Contas de moeda eletrónica: crescimento impressionante de 23,1% (2015) para 93,2% (2023).
- Persistem disparidades: mulheres e população rural têm menor probabilidade de possuir contas.
2.3. Uso dos serviços
- Apenas 49% dos adultos com conta bancária realizam depósitos regulares.
- Em contraste, 75% dos adultos com conta de moeda eletrónica a utilizam frequentemente para transações.
- A poupança continua baixa, condicionada por rendimentos limitados e falta de confiança no sistema.
2.4. Crédito, seguros e pensões
- Crédito ainda concentrado em segmentos formais e urbanos, apesar da crescente ligação com instituições de moeda eletrónica.
- Seguros apresentam baixa penetração, mas os microsseguros têm impacto positivo em grupos de baixo rendimento.
- Pensões cobrem sobretudo trabalhadores formais; acesso da população rural e informal é residual.
2.5. Desafios estruturais
- Forte dependência de numerário.
- Baixa penetração de internet e smartphones, principalmente nas zonas rurais.
- Fraca literacia financeira e digital.
- Barreiras de rendimento e documentação para abertura de contas.
- Baixa confiança no sistema financeiro formal.
3. Visão, Objectivos e Princípios da ENIF 2025–2031
Visão:
“Assegurar que todos os cidadãos moçambicanos tenham acesso e utilizem, de forma responsável e segura, produtos e serviços financeiros acessíveis e de qualidade, promovendo crescimento económico sustentável e bem-estar social.”
Objectivos estratégicos:
- Expandir o acesso físico e digital a serviços financeiros.
- Aumentar o uso efetivo e de qualidade dos produtos e serviços.
- Promover a literacia financeira e digital.
- Reforçar a proteção do consumidor e a confiança no sistema.
Princípios orientadores:
- Sustentabilidade e responsabilidade social.
- Equidade territorial e de género.
- Digitalização e inovação tecnológica.
- Proteção ambiental (finanças verdes).
- Alinhamento com políticas nacionais e compromissos internacionais.
4. Pilares Estratégicos de Implementação
Pilar 1 – Expandir o Acesso
- Incentivar novos pontos de acesso (POS, ATM, agentes).
- Melhorar políticas de identificação civil (BI) para facilitar abertura de contas.
- Expandir cobertura digital (banda larga e USSD).
Pilar 2 – Aumentar o Uso de Produtos e Serviços
- Promover pagamentos digitais e reduzir dependência de numerário.
- Melhorar o acesso ao crédito, incluindo linhas para PME e agricultores.
- Ampliar seguros e pensões, com inovação em microsseguros.
- Introduzir mecanismos de financiamento verde.
Pilar 3 – Promover Literacia Financeira
- Implementar Programa Nacional Único de Educação Financeira.
- Campanhas de literacia digital, sobretudo em zonas rurais.
- Parcerias com escolas, universidades e mídia comunitária.
Pilar 4 – Reforçar a Proteção e Confiança
- Regulamentação clara e transparente de produtos financeiros.
- Proteção de dados e segurança digital.
- Mecanismos de reclamação acessíveis.
- Campanhas de consciencialização sobre direitos do consumidor.
5. Implementação e Governança
- Comité Nacional de Inclusão Financeira (CNIF): órgão de supervisão.
- Unidade Técnica de Implementação (UTI): coordenação operacional.
- Grupos de Trabalho temáticos: dedicados a áreas como crédito, seguros, pagamentos digitais, finanças verdes e proteção ao consumidor.
Fases de implementação:
- 2025–2027: expansão do acesso, promoção de pagamentos digitais, crédito, seguros e finanças verdes; execução do programa nacional de literacia; reforço da segurança digital.
- 2028–2031: redefinição de prioridades após avaliação intercalar.
6. Monitoria e Avaliação
- Baseada na Teoria da Mudança, que relaciona intervenções, resultados esperados e impactos.
- Banco de Moçambique lidera o processo de recolha e análise de dados.
- Indicadores-chave: número de contas ativas, frequência de uso, volume de pagamentos digitais, cobertura de seguros, nível de literacia financeira, entre outros.
7. Desafios a Superar
- Reduzir disparidades rural-urbano.
- Aumentar confiança da população nos serviços formais.
- Estimular literacia financeira e digital, com foco na juventude e nas mulheres.
- Garantir sustentabilidade do sistema frente a riscos económicos e climáticos.
- Expandir cobertura de internet e infraestruturas digitais para viabilizar os serviços financeiros digitais.
8. Conclusão
A ENIF 2025–2031 é um roteiro ambicioso que pretende transformar a inclusão financeira em motor de desenvolvimento. Aposta na expansão territorial, digitalização, literacia, inovação em seguros e crédito e na criação de um ambiente regulatório protetor e transparente.
O sucesso dependerá da coordenação eficaz entre governo, reguladores, instituições financeiras, setor privado e parceiros de desenvolvimento. Se implementada com rigor, esta estratégia poderá não apenas aumentar o acesso e uso de serviços financeiros, mas também contribuir para uma Moçambique mais inclusiva, resiliente e próspera.
